Quando solicitar exames de imagem na dor lombar

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Quando solicitar exames de imagem na dor lombar?

A avaliação da dor lombar (DL) representa um desafio clínico multifacetado, dada a sua grandeprevalência globale o impacto substancial na qualidade de vida e na capacidade de trabalhodos indivíduos. A prevalência é estimada em 7,5%, e mais de 80% da população experimentará dor lombar em algum momento da vida. Felizmente, a maioria dos casos (85-90%) é de origem inespecífica, sem uma patologia estrutural subjacente grave detectável após detalhado exame físico e anamnese.

Neste contexto, a solicitação de exames de imagem, como radiografias, tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM), exige uma abordagem criteriosa e baseada em evidências. A proposta inicial é discernir se os sintomas manifestados sugerem uma condição subjacente de maior gravidade que justifique investigação imediata.

A identificação de anormalidades degenerativas e discais em exames de imagem

é frequenteem indivíduosassintomáticos. A correlação entre a gravidade dos achados de imagem e a sintomatologia clínica é frequentemente ausente.

Portanto, a realização rotineira de exames de imagem para dor lombar não complicada é geralmente desaconselhada, pois pode levar a sobrediagnóstico, ansiedade desnecessária do paciente e até mesmo a intervenções iatrogênicas.

A decisão de solicitar exames de imagem é primariamente guiada pela presença de "bandeiras vermelhas" (red flags), indicativos de patologias graves, ou, em um segundo momento, pela persistência de sintomas com "bandeiras amarelas"(yellow flags) que sinalizam risco de cronificação.

As "bandeiras vermelhas" são critérios clínicos que levantam a suspeita de condições subjacentes sérias, as quais, embora raras (ocorrendo emmenos de 1% a 5%dos casos de dor lombar em atenção primária), demandam investigação diagnóstica rápida e, frequentemente, intervenção específica.

A lógica por trás da pesquisa dessas bandeiras é identificar prontamente doenças oncológicas, reumatológicas, infecciosas, traumáticas (fraturas) e compressões de estruturas neurológicas.Adicionalmente, dores viscerais referidas, embora não clássicas bandeiras vermelhas, também devem ser consideradas.

BANDEIRA VERMELHA

DOENÇA

PREVALÊNCIA

  • trauma (mesmo leve em idosos)

  • idade > 70 anos

  • osteoporose

  • uso crônico de corticoides

  • perda de altura vertebral ou deformidade aguda

Fratura vertebral

0,7 – 4,5 %

  • dor noturna/repouso que não melhora

  • perda de peso não intencional

  • febre/calafrios

  • câncer prévio (mama, pulmão, próstata, rim, tireoide, mieloma, linfoma, melanoma)

  • idade > 50 anos

Neoplasia maligna (primária ou metastática)

0,2 %

  • febre

  • sudorese noturna

  • dor lombar persistente que piora com carga

  • déficits neurológicos rápidos

  • drogas endovenosas

  • imunossupressão

  • cirurgia/trauma espinhal recentes

  • infecção pré-existente

  • sensibilidade focal em apófise espinhosa

Infecção espinhal (discite/osteomielite/abscesso epidural)

0,01 %

  • dor lombar < 40 anos

  • rigidez matinal > 30 minutos

  • melhora com exercício

  • dor alternada nádegas

  • uveíte, psoríase, doenças inflamatórias intestinais

Espondiloartrite axial

(dor inflamatória)

0,1 – 1,4 %

  • anestesia em sela

  • disfunção vesical/intestinal (esfincteriana) nova

  • ciatalgia bilateral

  • fraqueza progressiva MMII

Síndrome da cauda equina

0,04 %

  • dor lombar + dor abdominal/flanco/virilha, disúria, GI

  • febre

  • massa abdominal pulsátil, hematúria subjacente

Dores referidas (AAA, pancreatite, pielonefrite, úlcera, cólica renal)

2 %

Outra motivação é se os sintomas persistirem ou progredirem por um período de mais de 6 a 12 semanas(o que já caracteriza uma dor lombar subaguda ou crônica), e após um período de tratamento conservador otimizado, o exame de imagem pode ser considerado. A justificativa seria de que o resultado do exame tenha a potencialidade de alterar a conduta clínica do paciente, como a indicação para procedimentos invasivos ou cirurgia, ou paraelucidar uma incerteza diagnóstica que não foi resolvida clinicamente. É crucial que esta decisão seja tomada em conjunto com um cirurgião de coluna ou um especialista em dor, evitando exames desnecessários.

Em suma, a decisão de solicitar exames de imagem na avaliação da dor lombar deve ser guiada por um raciocínio clínico complexo e detalhado, priorizando a anamnese abrangente e o exame físico minucioso. A presença de "bandeiras vermelhas" é o principal indicador para a investigação por imagem urgente, direcionando o tipo de exame (RM, TC, radiografia) e a temporalidade, conforme a suspeita diagnóstica.

A compreensão e aplicação desses princípios são cruciais para otimizar o cuidado ao paciente, minimizar exposições desnecessárias e reduzir os custos associados à dor lombar.

REFERÊNCIAS:

  • HALL, A. M. et al. Do not routinely offer imaging for uncomplicated low back pain. BMJ (Clinical research ed.), v. 372, p. n291, 2021.

  • OERTEL, J. et al. Acute low back pain: Epidemiology, etiology, and prevention: WFNS spine committee recommendations. World neurosurgery: X, v. 22, n. 100313, p. 100313, 2024.

  • SANDERSON, A. et al. The effect of chronic, non-specific low back pain on superficial lumbar muscle activity: a protocol for a systematic review and meta-analysis. BMJ open, v. 9, n. 10, p. e029850, 2019.

  • TEDESCHI, R. et al. Classifying low back pain through pain mechanisms: A scoping review for physiotherapy practice. Journal of clinical medicine, v. 14, n. 2, p. 412, 2025.

  • DORSALGIA – BMJ Best Practice

  • Subacute and chronic low back pain: Nonsurgical interventional treatment – UpToDate

AUTORA:

Letícia de Paula Palmeira

DATA:

02/07/2025

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